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Iniciativa Pró-Montado Alentejo quer fundos próprios para a floresta autóctone e para o combate à desertificação
2019-08-07A Iniciativa Pró-Montado Alentejo (IPMAlentejo), movimento cívico criadoem 2018 e que junta cientistas, produtores agrícolas e florestais, ex-governantes, autarcas e ambientalistas, convocou a imprensa esta quarta-feira (7 de agosto) para alertar para urgência de defender o montado alentejano como a única barreira para travar o avanço do deserto para norte e como arma no combate às alterações climáticas.
O movimento, que já enviou uma carta ao primeiro-ministro e que já foi recebido pelo ministro do Ambiente, pede um programa de financiamento autónomo para o montado, com fundos nacionais e internacionais, propondo um plano a 20 anos para recuperar o montado perdido. Filipe Duarte Santos, geofísico, diz que "o Fundo Ambiental vai destinar verbas para adaptação às alterações climáticas, mas não tem nada previsto para as florestas, exceto para o combate aos fogos florestais”.
"Aquilo que nós pretendemos do Governo é que se dê atenção à floresta autóctone portuguesa e aquilo que propomos são soluções que são conhecidas, a densificação da floresta e do montado, em particular, e a proteção do solo e da capacidade de reter a água. Só surpreende que haja uma certa lentidão do País em encarar estes desafios que tem pela frente”, acrescenta Filipe Duarte Santos.
Pedro Marques Sousa, representante da iniciativa, acrescenta que "o que defendemos é que tem de haver um programa autónomo para isto. Há um problema estrutural. As alterações climáticas já não são uma coisa eventual e têm um caráter cada vez mais estrutural no Alentejo. Há muitas secas no Alentejo que não são secas nacionais e que, por isso, não têm peso político.”
"Já solicitámos ao primeiro-ministro que organize um esforço nacional para que se dote de fundos públicos nacionais e internacionais e que se crie um programa multi-fundos de 20 anos, que vá desde 2020 a 2040, completamente separado dos quadros de programação. Os quadros de programação supostamente têm seis ou sete anos e depois só têm verbas para quatro e ao fim de dois anos estão completamente esgotados, o que significa que não funcionam. Fomos a primeira organização que fez contas. Fomos ao PDR Florestal e começámos a fazer contas relativamente ao valor por hectare de fundos comunitários disponíveis para apoio da floresta em Portugal, em todas as vertentes. Resumindo tudo, temos 502 milhões de euros para um período de seis a sete anos, que na verdade são cerca de 300 milhões de euros porque há o chamado carry over de projetos e candidaturas de investimento de melhoria, adaptação e até florestação que são transacionadas do período anterior. Estamos a falar num valor para 3 milhões e 150 mil hectares inferior a 20 euros por hectare. Se toda a gente decidisse pegar na sua floresta e pedir apoios para questões restruturais relacionadas com alterações climáticas, o PDR seria uma impossibilidade”, explica ainda.
"O que nos parece é que tem de haver um programa dedicado e que complemente o FEADER e o Fundo de Coesão. Parece-nos que é um problema de coesão. O Alentejo é quase 30% da área de Portugal Continental e se juntarmos o FEADER, o Fundo de Coesão, o Fundo Ambiental e, eventualmente, até uma parte do Fundo de Carbono, acabamos por gerar massa crítica para fazer um programa à séria e estruturante que resolva esta ameaça.”
Júlia Seixas, cientista da Faculdade de Ciências e Tecnologias de Lisboa e uma das coordenadoras do Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050, apresentado pelo Executivo, aproveitou a ocasião para lembrar que, apesar de as medidas para a mobilidade serem importantes, "nunca conseguiremos atingir a neutralidade carbónica sem a floresta”.
A investigadora lembrou que a floresta portuguesa é responsável por reter entre 7 a 11 milhões de toneladas de CO2 por ano, contudo, em 2018, em vez de reter carbono, emitiu cerca de 7 milhões de toneladas de CO2, o que revela a importância de um programa a longo prazo para apoiar os dois tipos de floresta nacional, nomeadamente através da prevenção dos incêndios na floresta de produção lenhosa (centro e norte) e da adaptação climática na floresta multifuncional (no sul).
"A Iniciativa Pró-Montado Alentejo vem defender, junto das forças políticas, o uso da floresta autóctone no Alentejo para obter a necessária amenização climática”, defendem os envolvidos na Iniciativa Pró-Montado, referindo que o foco deve estar na "adaptação climática dos montados de sobro e de azinho no Alentejo, restauro de povoamentos florestais já muito degradados e a expansão da mancha atual de quercíneas [carvalhos, azinheiras e sobreiros] do Alentejo”.
O movimento defende ainda que o montado alentejano passe dos 835 000 hectares atuais para 1,5 milhões de hectares. "Esta expansão visa garantir a melhoria do microclima da região, em termos de humidade e temperatura do ar e do solo, e contribuir para um maior nível de precipitação, sobretudo, se se mantiver um contínuo florestal desde a sua orla marítima e, em especial, nas serras”.
"O melhoramento e expansão dos acuais 835 000 hectares de montados do Alentejo, através do aumento associado da matéria orgânica do solo e da fertilidade em geral, do incremento das pastagens melhoradas e com crescimento de árvores novas nas clareiras, não só contribuirá para uma maior captação de infiltração e fixação de água nos solos, como será importante para o compromisso nacional com a neutralidade carbónica a atingir em 2050”, dizem ainda os subscritores na iniciativa.
Eugénio Sequeira, ambientalista e ex-presidente da Liga de Proteção da Natureza, explicou que é preciso encontrar formas de conservar os solos para travar a desertificação e, ao mesmo tempo, de captar água, e que "o montado é um travão do avanço do deserto”.
Fonte: Vida Rural
Texto: Ana Rita Costa